Li e acompanhei, com alguma atenção e interesse, a polémica que envolveu o Governo Regional e o Presidente da Assembleia Regional, do Príncipe, em torno do projecto de construção do porto de águas profundas que, possa vir a alimentar, no futuro, a indústria petrolífera nacional.
É óbvio que eu sou, estruturalmente, contra tiques censórios independentemente da sua origem, latitude ou expressão; da mesma forma, que, sou contra expedientes, conscientes ou inconscientes, de atomização do poder. Ambos fragilizam as instituições, o governo e a Assembleia Regional, do Príncipe, e, no conjunto, fragilizam os propósitos de aprofundamento autonómico que estão na base da vontade da população da nossa terra.
Compreende-se mal estes tiques porque é o próprio Governo regional que, tendo em conta os seus propósitos eleitorais, inaugurou, no país, uma nova forma de fazer política, cujas expressões, mais significativas, são os espaços radiofónico “TRIBUNA DO CIDADÃO” e o “FÓRUM DE DEBATE VIRTUAL” que constituem referências, no país, em prol do desenvolvimento da nossa embrionária democracia. Desde a implementação de democracia, no país, não conheço contributos originais, com alcance e efeitos destes, para a aproximação entre eleitos e eleitores e, consequentemente, para o desenvolvimento da nossa democracia participativa. Acredito que este acto censório seja algo efémero, conjuntural, insignificante e, até, ingénuo, tendo em conta os propósitos do governo regional, supra referenciados, em prol do desenvolvimento da democracia local e nacional.
Parece-me pertinente, também, salientar a tendência para a anomia, consequência da fragmentação do poder no interior da Assembleia Regional, que tende a enfraquecer a instituição em causa, num momento em que ela precisaria de solidariedade institucional, entre os seus membros, para levar em diante os seus propósitos de referência da democracia e de fiscalização dos actos do governo regional. Quando se entra em estado de anomia, frequentemente os costumes degeneram-se e, perde-se o sentido de solidariedade institucional, política e social. Momentaneamente confunde-se, localmente, as competências do Presidente da Assembleia Regional com as competências da própria Assembleia Regional. Isto é perigoso, e tendencialmente negativo, porque prejudica o fortalecimento institucional, do referido órgão de poder regional, num momento, de fragilidade, em que a retórica política discursiva se faz em torno da reivindicação do novo Estatuto político-administrativo para a região, bem como, da Lei das Finanças Regionais. Tendo em conta os acontecimentos em causa, poder-se-ia perguntar: qual é o papel, poder e dever, dos deputados da Assembleia regional, neste contexto concreto? Como é garantido a reclamação e recurso das decisões erróneas do Presidente da Assembleia Regional que se auto-proclama César perante os seus deputados?
Não basta a inscrição na nossa lei fundamental do princípio da separação de poderes para ficarmos imunes contra vontades autoritárias de qualquer espécie. A prática política tem de ser feita em total obediência ao ordenamento jurídico prevalecente na região e no país. Isto é válido para o Governo Regional como para a Assembleia Regional. Acredito que a inexistência de um novo estatuto político-administrativo para a região possa estar na base de incongruências, interpretações pessoais erradas relativamente às competências institucionais da Assembleia Regional e de propósitos de atomização de poder que forjaram a polémica anteriormente mencionada.
Relativamente ao porto de águas profundas, para apoiar o processo nacional de exploração de petróleo, as consequências locais, decorrentes da sua construção, no contexto ambiental, social, económico, político e estratégico, merecem algumas considerações.
Em primeiro lugar, a localização dos blocos ou jazidas petrolíferas, segundo estudos técnicos divulgados, até então, estão mais próximos do Príncipe do que de S.Tomé. Sendo assim, haveria sempre, a montante, um conflito de interesses por resolver: o propósito do país viabilizar a exploração do petróleo e o potencial impacto ambiental, para o Príncipe, (volto a repetir, para o Príncipe) resultante desta exploração, tendo em conta a sua localização geográfica. Ou seja, estando o Príncipe mais perto das jazidas, seria, em princípio, mais exposto aos impactos ambientais resultantes da referida exploração. No início, quando o problema de viabilização de propósitos de exploração petrolífera, no país, foi colocado, faria todo o sentido, de ponto de vista político, colocar-se as seguintes questões: deve-se poupar o Príncipe, de ponto de vista ambiental, ou caminhar no sentido da exploração do petróleo no país? Que contributos ou contrapartidas deverá o Príncipe, e sua população, receber perante um sacrifício ambiental desta grandeza? Não creio que o Governo Regional, naquela altura, a Assembleia Regional e o próprio primeiro-ministro do país, (que era um natural do Príncipe) tivessem levantado as questões em causa e influenciado, de forma bastante favorável, as condições ou contrapartidas para o Príncipe, expressas na Lei-quadro dos Recursos petrolíferos, decorrente deste sacrifício ambiental. Naquele momento era oportuno e pertinente que o problema fosse colocado, debatido localmente e suportado por uma larga maioria de consenso popular local. Estava em causa o modelo de desenvolvimento para a ilha e para o país. Ou seja, era um problema eminentemente político e não técnico. Com o nosso silêncio legitimamos a acção do Governo central, em prosseguir com a exploração e extracção do petróleo e, adoptar um novo paradigma para o desenvolvimento das ilhas. Fomos, voluntária ou involuntariamente, parte integrante deste consenso nacional sobre o novo paradigma de desenvolvimento para o país. Não tendo feito o que deveria ser feito, na altura, parece-me um erro político, desnecessário, fazê-lo agora, que a teia de interesses se internacionalizou, decorrente da assinatura de contratos variados e, parece uma inevitabilidade, para o país, a exploração do referido recurso. O problema para o Príncipe, neste momento, não é tanto a escolha entre o “envenenamento forçado” e “desenvolvimento saudável”, livre do petróleo. Este problema político deveria ser posto, a montante. Se o problema político foi resolvido assim, parece-me estranho e inoportuno escudar, agora, (não é esta a função nem vocação da Assembleia Regional) nos contornos de problemas de natureza técnica, relacionados com a exploração do petróleo. Desde o principio que se sabe que as coisas se passariam, de ponto de vista técnico, desta forma, muito embora se possa considerar que, do ponto de vista ambiental, não são as actividades de prospecção sísmica, exploração e extracção as fases mais preocupantes da actividade petrolífera. De facto, os problemas ambientais, mais frequentes, relacionados com o petróleo, estão associados ao transporte, armazenamento, refinação e consumo de derivados.
Príncipe, pela sua posição geográfica, sofreria sempre, potencialmente, riscos decorrentes da exploração, extracção e transporte de petróleo, independentemente de ter ou não o porto de águas profundas de suporte a estas actividades. Não tendo o porto e estando exposto aos tais riscos parece-me evidente que a melhor opção é ter o porto que poderá ser útil do ponto de vista estratégico para os interesses regional. Estas duas infra-estruturas (porto de águas profundas e o aeroporto) parecem-me estratégicas para os interesses da nossa afirmação autonómica e desenvolvimento local.
Sendo, no entanto, um dado adquirido, as fragilidades, de natureza ambiental, para o Príncipe, decorrente da exploração do petróleo, seria razoável e pertinente a adopção de medidas, antes e durante a actividade em causa que minimizasse os referidos riscos. Não é isto, infelizmente, o que se verifica. Os responsáveis governamentais nacionais preocuparam-se somente, ou sobretudo, com aspectos técnicos e legais que conduzam, no futuro, à exploração e extracção do petróleo minimizando a temática ambiental. Seria prudente e desejável que: a) fosse feita a elaboração, análise e debate público de estudos de impacto ambiental associado; b) se criasse mecanismos legais que permitisse uma compensação ambiental, paga no momento ou início de exploração petrolífera por parte do Estado central ou empresas, às populações mais expostas aos riscos de natureza ambiental decorrentes da exploração; c) se permitisse, através de mecanismos legais, a assinatura de compromissos, perante a justiça, por parte de empresas que promovem a exploração do recurso em causa, localmente, como garantia das suas obrigações perante acidentes ambientais; d) se promovesse a criação, juntamente com entidades competentes na matéria, (Universidades estrangeiras vocacionadas para o efeito) de um centro de monitorização que se preocupasse com o impacto e evolução ambiental, observação e controlo de manchas de óleo, inspecção, etc; e) se criasse condições e enquadramento legal que permitisse a entrega, por parte das empresas petrolíferas de uma percentagem reduzida para associações locais de natureza ambiental, cooperativas e associações de pescadores, etc. f) se fomentasse o incremento local do associativismo ambiental.
A.C.
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