O fenómeno que se vulgarizou com o nome “Banho” não pode nem deve ser comparável com aquilo que acontece em democracias mais avançadas e aparentemente consolidadas. E, qualquer tentativa de comparação destas duas realidades parece-me redutora e impertinente. Nestas democracias mais avançadas, (e não estou só a falar de países europeus) o essencial em qualquer campanha eleitoral é a mensagem política e propostas que são apresentadas ao eleitorado, estando o resto (pequenas oferendas de natureza simbólica) confinado ao acessório e folclore, como forma de entusiasmo festivo das próprias caravanas eleitorais e de potenciais eleitores. É por isso, que, todas estas oferendas são simbolicamente assinaladas com as siglas dos respectivos partidos e/ou coligações. De uma coisa temos todos a certeza: os responsáveis partidários falam dos respectivos programas eleitoras; debitam promessas, sendo que algumas delas não são cumpridas; criticam as propostas dos adversários; apresentam obras; discutem ideias e problemas que afligem as respectivas populações, etc. Os eleitores, os jornalistas, a opinião pública em geral e a comunidade internacional, não perdem tempo nem se lembram destas oferendas que, de facto, constituem o acessório. Por alguma razão isto acontece. Outra coisa completamente diferente, é reduzir toda a acção política desejável no período eleitoral ou pré-eleitoral, ao “BANHO”, ou seja, distribuir dinheiro (e outros bens valiosos) aos potenciais eleitores, comprando-os literalmente, transformando assim o acto eleitoral, numa espécie de leilão. É óbvio que, num contexto sócio-económico e cultural como o de S.Tomé e Príncipe, quem tiver mais dinheiro ganha as eleições. As propostas políticas não valem nada num contexto com estas características. Por isso mesmo, é que os políticos não se esforçam em fazer o trabalho de casa, pois estão convencidos que o mais importante é terem o dinheirinho para ganharem as eleições e mais tarde pensarem naquilo que vão fazer com o país. Por isso também, é que, abunda na campanha eleitoral acusações mútuas de corrupção em vez de falarem ou debaterem sobre os instrumentos que eventualmente utilizariam num hipotético governo, para minimizar os níveis de corrupção no país. Quem se lembra de uma proposta concreta levantada pelos partidos políticos nesta campanha eleitoral, com o objectivo de combater o problema da corrupção no nosso país??? No entanto, todos eles entretêm-se em acusações mútuas sobre o fenómeno em causa, e, segundo alguns entendidos na matéria, bem como os conteúdos de alguns relatórios que são produzidos por agências internacionais, a corrupção endémica é o nosso maior problema momentaneamente.
Em 2004, relacionado com este fenómeno escrevi isto: «…Num contexto de debilidade institucional a todos os níveis e limitativo em termos de reivindicação e participação cidadânica, estão criadas assim, desde a base até ao topo, as condições para o processo de COMPRA DO PODER, enquanto uma mercadoria ou negócio, posicionando-se já, na primeira linha, decorrentes do interesse e apetite pela temática petróleo no país, compradores endinheirados, de origem mais ou menos longínqua. Neste caso, o processo político como fenómeno de conquista da adesão do governado desaparece, e, os partidos políticos estão a transformar-se paulatinamente, em agências mercantis. Por isso, é que, se torna imprescindível muito dinheiro e envolvência de países terceiros bem identificados, nos momentos eleitorais em S.Tomé e Príncipe…»
Estas eleições só vieram reforçar aquilo que eu, naquela altura pensava, sobre o rumo que o nosso sistema partidário estava a tomar.
O curioso, é que são os próprios partidos políticos que já começam a achar a situação em causa insustentável e começam a transferir a responsabilidades dos seus actos para os eleitores e para o povo em geral.
Cada vez mais, tenho muitas dificuldades, em compreender e/ou interpretar racionalmente, as preocupações e perplexidades do Senhor Presidente da República, Fradique de Menezes. Há bem pouco tempo, o Senhor Presidente da República afirmou não compreender como é que um recente relatório do Banco Mundial assinalava um aumento considerável dos índices de CORRUPÇÃO no país. Isto deixou toda a gente estupefacta, na medida que, o mesmo Presidente da República, no início do seu mandato considerava a CORRUPÇÃO como o nosso maior problema, comparando-a mesmo, com um cancro ou paludismo que, minava as condições para o nosso desenvolvimento.
Agora, segundo a lusa, numa declaração ao país relacionada com as eleições legislativas que se realizam momentaneamente, o Senhor Presidente da República vem dizer que: «…recebeu informações, segundo as quais está a ser preparada uma fraude conhecida como “boca das urnas” em que um “pagador” entrega um boletim já preenchido ao eleitor antes de este entrar nas secções de voto…»
Acrescentou que: «…esta variante sofisticada priva o eleitor do seu direito de exercer o voto…»
Juro que não percebo o alcance destas palavras do Senhor Presidente da República. Só agora o Senhor Presidente da República descobriu, por obra e graça de um passarinho, que, não há liberdade de voto em S.Tomé e Príncipe???? Onde é que o Senhor Presidente da República tem estado???? Por que razão não fez estes apelos no contexto temporal anterior ao da campanha e realização do acto eleitoral em causa? Que contributos pedagógicos, cívicos e de cidadania o Senhor Presidente da República trouxe, desde que se instalou no palácio cor-de-rosa, para a credibilização e aprofundamento da nossa democracia, designadamente para a minimização ou resolução do problema do “BANHO”?? Só nos faltava esta!!!!! Por que razão o Senhor Presidente da República não começou por fazer estes reparos ao movimento que inspirou ou lidera, designadamente o MDFM-PL, relativamente ao problema do “BANHO”, sendo o movimento em causa, a principal escola desta nossa “virtude” eleitoral e democrática???? Os valores das preocupações e palavras de Sua Excelência Senhor Presidente da República, serão tanto maiores e respeitados pelo povo, quanto maior for a sua credibilidade e legitimidade.
A.C
Numa entrevista saída no “The New Yorker” em Outubro de 2002, Fradique de Menezes disse, algo triste, ao jornalista Jon Lee Anderson: «… O ano passado, eu tinha uma boa vida, ganhava dinheiro, tinha meninas e festas, e vieram os TROVOADAS perguntaram-me se eu gostava de ser PRESIDENTE, e aqui estou eu!...»
Hoje, volvidos sensivelmente 5 anos, na recta final do mandato do Senhor Presidente da República, Fradique de Menezes, o Senhor Patrice Trovoada disse numa entrevista, que, aquele (Fradique de Menezes) seria o resultado de um “erro de casting”.
Definitivamente, já começou a campanha eleitoral para as Presidenciais, ainda antes de conhecermos o resultado das actuais legislativas.
Ficamos também a saber que, existe um filho adoptivo que, mesmo contrariado, aceitou a condição de adopção, e posteriormente de monarca, guerreando mais tarde contra o próprio pai. Por outro lado, o filho legítimo aparece no intervalo de uma contenda, a questionar a paternidade ou erro de concepção do irmão adoptivo. O que pensa o pai de tudo isto???????
Notícia do Expresso – 15 de Março de 2006
Portugal e outros países suspeitos de financiar partidos
Compra de votos marca Campanha Eleitoral
«…O “Banho”, ou seja, a “caça aos votos” mediante pagamento em dinheiro, está a dominar a campanha para as eleições legislativas de 26 de Março em São Tomé e Príncipe. Dada a inexistência de uma lei que regule o financiamento e controle dos gastos dos partidos, os investidores externos, os chamados países “amigos” dos políticos São Tomenses – Nigéria, Taiwan, Angola e Portugal – são suspeitos de injectarem milhões de dólares nas candidaturas dos vários partidos em confronto.
Dez forças políticas concorrem as legislativas e procuram seduzir os 76842 eleitores inscritos. Os partidos que mais beneficiam da “compra de votos” são o Movimento de Libertação de São Tomé e Príncipe (MLSTP – PSD), o Movimento Democrático Forças da Mudança (MDFM) que apoia o Presidente Fradique de Menezes, e a Acção Democrática Independente (ADI). Todos os outros, com menos recursos financeiros, ficam à partida a perder na “caça aos votos”.
O fenómeno – que passou a fazer parte do cenário político desde as legislativas de 1998 e 2001 – está tão enraizado, que grande parte do eleitorado exige prendas em dinheiro ou bens para ir votar. A situação chegou a um ponto, que já não se percebe bem se são partidos que se aproveitam dos eleitores ou, pelo contrário, se são os eleitores que exercem chantagem sobre os candidatos…»
Fonte – Jornal Expresso
E assim vamos construindo um país, deixando este legado aos jovens e crianças de hoje, que, terão a vida mais complicada no futuro, se, quiserem de facto, fazer política e ajudar a aprofundar a democracia na nossa Terra. Estas crianças e jovens, terão todos os motivos do mundo, para sentirem vergonha desta “gente” que se vangloria e passeia nos púlpitos improvisados, a arrogância e o utilitarismo das suas acções políticas para o nosso bem-estar colectivo. Esquecem-se no entanto, que, a política é uma acção, ou seja, tem necessariamente resultados e efeitos, e também é uma relação, desenvolvendo-se num contexto onde nenhum decisor é solitário e independente dos outros. Estão totalmente convencidos que estão a fazer política. Mais tarde ou mais cedo, esta prática que começa a cristalizar na nossa Terra, acabará por encontrar o obstáculo das realidades sociais e materiais que determinarão o seu fracasso. Quando tal acontecer esta “gente” já não estará cá. As crianças e jovens de hoje não terão orgulho nenhum dos caprichos e práticas desta “gentalha”. Reparem naquilo que disse o Patrice Trovoada recentemente, relativamente aos efeitos do “Banho”: «…os partidos foram apanhados no seu próprio jogo…» Acrescentou posteriormente: «…hoje estamos a pagar por isso, porque as pessoas estão a exigir, a manipular os partidos…»
Isto ainda é o ensaio da tempestade que está para chegar. Não basta o Patrice Trovoada e outros dirigentes políticos nacionais fazerem o mea culpa envergonhado, transferido com tal, a responsabilidade das suas acções e trapalhadas para o próprio povo. Se o papel dos partidos políticos é essencial num regime democrático, o reconhecimento da sua responsabilidade activa ou reactiva, em todos os factos políticos nacionais, também não deverá ser minimizado. Todos os partidos políticos devem ser responsabilizados por esta prática que, terá efeitos nocivos no aprofundamento da nossa democracia. Acho que este tema do “Banho” deveria por isso, ser momentaneamente, (aproveitando o acto eleitoral) objecto central das preocupações, discussão e apresentação de propostas, por parte de todos os partidos políticos nacionais, para a sua erradicação. Não! Os partidos decidiram continuar ou amplificar a referida prática, no acto eleitoral em causa.
Por tudo isto, é de elogiar e enaltecer o comportamento de todas as forças políticas minoritárias, designadamente o “MOVIMENTO NOVO RUMO”, “GERAÇÃO ESPERANÇA” e outras, que, se esforçam numa campanha pedagógica e de sensibilização sem precedentes (porta a porta; freguesia a freguesia; roça a roça) para minimizar os estragos que esta “gente” tem feito ao país. É um trabalho muito esforçado e paciente!
A.C
Há algo de novo, potencialmente vital para a nossa democracia, nestes primeiros dias da campanha eleitoral no país. Outrora, a participação (entendida e interiorizada como sinónimo de “banho”) indiciava perigo de instrumentalização, comportando ambiguidades e ambivalências, não trazendo nada de relevante em termos de proveito para a colectividade nacional. As consequências visíveis foram: a instalação na nossa sociedade do conformismo, comodismo e uma incompreensível inércia, que, comprometeu a reflexão desejável e constante que, devia existir, sobre as relações entre a nossa segurança e a liberdade, bem como, o Estado e a sociedade civil. Esta perversão dos princípios elementares de democracia trouxe um pagamento de preços elevados que todos tivemos que pagar.
A primeira prestação está bem vincada na sucessão e intensidade de crises políticas, que, foram sucedendo no país, minando as relações entre os principais actores institucionais.
A segunda prestação, está patente na generalização da impunidade, que, actua como seguro de sobrevivência para os desmandos e atropelos praticados por aqueles, que, em princípio, deviam ter funções de representação e de expressão na nossa sociedade (os próprios partidos políticos). Passaram a pensar, agir e decidir, desprezando a legalidade e respeito pelos próprios e pelos outros.
A terceira prestação do preço a pagar, relativamente à perversão dos princípios elementares da democracia na nossa sociedade é a consequência das duas prestações anteriores: a multiplicação de golpes de Estado e insurreições militares no país.
É óbvio que, num cenário com estas características, o aparecimento de um MOVIMENTO, aparentemente com ímpeto reformador, com atitudes e práticas diferenciadoras do stato quo, só pode merecer um juízo favorável e encorajador, contribuindo assim, para dar um RUMO mais favorável e NOVO ao desenvolvimento do país. Por isso, acho pertinente e desejável, a atitude pedagógica e persistente, junto do povo (nas roças, nos bairros, nas freguesias, etc.) levada a cabo por alguns potenciais eleitos daquele NOVO movimento político, com o objectivo de reanimar a confiança da sociedade civil, nas instituições político-partidárias do país. Parece-me ser um trabalho extremamente difícil e potencialmente desanimador, mas, não me ocorre outra fórmula, para o restabelecimento da confiança e credibilidade junto do povo, depois dos efeitos sociais significativos, decorrentes da instabilidade ou ruptura funcional da generalidade dos nossos partidos políticos clássicos. As vantagens deste modus operandi, (roubei-te a palavra Cency) poderão não ser imediatas, mas, ficará a semente, que, germinará de certeza absoluta.
A.C
Tarde de Agosto de dois mil e cinco. Dezassete horas e trinta minutos! Antonieta acabou de chegar à casa. Vive com o marido e o filho mais novo, numa pequena casa inacabada, que começara a construir há quinze anos atrás. Com o cimento das primeiras presidenciais fez os primeiros alicerces, as chapas de zinco das legislativas seguintes, preencheram parcialmente o telhado, e, as tábuas e pregos das últimas presidenciais contribuíram para o resto. A casa parou no tempo desde então. Antes de chegar à casa, Antonieta conversara com algumas pessoas na rua, em trabalho de culto religioso, fizera uma visita relâmpago ao cantinho da mãe que, vive sozinha, e padece de uma doença que lhe rouba todos os dias, pedaços de carne. Os médicos não conseguem descortinar as causas da referida doença, por insuficiências de meios de diagnóstico complementar. Aproveitou também a ocasião, para passar em casa da irmã Juvelina, com o objectivo de apanhar o filho mais novo que, repete pela terceira vez a quarta classe. Divertira com as amigas num emprego do Estado, num pagode contagiante, promovido pelo chefe da repartição em causa. De facto, fora neste último que passara os melhores momentos do dia, entre parcos afazeres profissionais e loucura de um chefe de repartição, promovido por razões que só o tempo há-de descortinar. São 3.30 horas da manhã seguinte. Antonieta acorda com o seu despertador diário: uma rajada de tiros, provavelmente de metralhadora, desferido por um vizinho, com objectivo de afugentar amigos do alheio que, têm provocado danos nas redondezas. Ontem foi a cabra do senhor Vitó, anteontem a bateria da carrinha do Januário e, na semana passada, levaram toda a mobília da senhora Zita. Todos desistiram de apresentar queixas, num contexto de impunidade generalizada e, os ladrões sabem disso. Por isso, mesmo contrariada, Antonieta agradece ao senhor Camblé, autor dos disparos, pela iniciativa em causa. Já são 4.17 horas! Antonieta acabou de fazer a oração matinal diária e, refugia-se na leitura de excertos da bíblia, entre a indiscrição dos ratos que fustigam os cantos da casa e o zelo exagerado de alguns automobilistas madrugadores, que, se cumprimentam, entre buzinadelas anunciadoras de uma aurora tranquila. Os galos também participam na festa, como que, querendo humanizar os quintais, despidos de esperança. Num gesto de quase continuidade religiosa, Antonieta prepara o almoço para o marido, desempregado há quatro anos e meio, e, entre pausas culinárias, varre o quintal, depois de ter caminhado quilómetro e meio, entre viagens sucessivas, com o objectivo de encher todos os vasilhames disponíveis em casa, com água aparentemente potável, para as diversas necessidades diárias. Nos minutos seguintes, prepara a merenda para o filho, que, entre a Escola no período da manhã, a Feira de Ponto onde vende plásticos e a casa da tia onde espera pela mãe até bastante tarde, não tem tempo de voltar à casa. Búzios com pedaços magros de fruta-pão constituem a merenda, que, se repete pela quarta vez na mesma semana. Depois, entre a escolha de uma peça de roupa para levar para o trabalho, facilitada pela parca diversidade das mesmas, e, a ousadia de desconfiar do marido relativamente ao desaparecimento de quarenta mil dobras do interior de uma jarra, ainda tem tempo, para ir espreitando para a estrada, controlando a chegada do carro amarelo que, há-de transportá-la rumo ao emprego. Antonieta precisa irremediavelmente destes quarenta mil dobras, para, pagar o táxi, fazer algumas compras no mercado local, e, comprar medicamentos na Feira do Ponto para a mãe. São 7.38 horas! Antonieta decidiu confrontar directamente o marido com a sua desconfiança, sendo este um alcoólico inveterado, que, se encontra fundeado no colchão de palha lá da casa. «Fefé acorda!! Fefé! Você tirou dinheiro dentro de jarra??» Perante insistentes interpelações que acabaram por atrapalhar o sono e ronco do Fefé, este acorda e esmurra reiteradamente a esposa, que, fica com um dos olhos muito maltratado e a boca a sangrar. O filho assiste serenamente ao sucedido, denunciando a invariabilidade cénica que já é parte integrante da vida daquela família. Sem dinheiro na carteira e com menos um dente na boca, Antonieta e o filho começam a calcorrear a estrada de Mesquita, onde vivem, rumo à cidade. Chega irremediavelmente atrasada ao trabalho, cinquenta minutos, depois de ter deixado o filho na Escola. Não perde tempo nem energias com atemorizações, expedientes explicativos, ou desculpas, para o referido atraso, porque, sabe que o Director dos Serviços em causa, chegará também atrasado. Não era preciso ser bruxa! Eram 10.26 horas, quando o inefável Director, do alto da sua autoridade, suportada por um cartão de militante partidário e um moderníssimo jeep reluzente, estacionou o carro em causa, num parque improvisado. Outubro foi o mês terrível para Antonieta: o filho mais velho que cursara engenharia aeronáutica na ex-URSS e era guarda-nocturno num empreendimento turístico, suicidou-se, após um longo período de ensimesmamento, decorrente de uma esquizofrenia nunca diagnosticada nem tratada. O estado de saúde da mãe, também piorou de forma quase irreversível. O tempo parou ou retrocedeu para Antonieta, como a casa que começara a construir há quinze anos atrás. O ano de dois mil e seis, começa de forma menos brilhante ainda para Antonieta, depois de uma pequena satisfação inicial, com a notícia não oficial, de que, este ano seria o ano de muitas eleições no país. Seria uma boa oportunidade para acertar o passo com o tempo e acabar a referida casa. Em finais de Janeiro, Antonieta perde o filho, vítima de cólera, e, duas semanas depois, perde a mãe por causa de complicações renais inultrapassáveis. O marido, vive miseravelmente, vegetando entre tabernas e a ociosidade militante, com uma saúde corroída pelos estragos preliminares provocados por uma cirrose. Além disso, corre o risco de ir para prisão se, entretanto, não arranjar dez milhões de dobras, pedidos por um Juiz, como contrapartida, para impedir ou minimizar uma sentença desfavorável, decorrente de um caso, em que este participara activamente, culminando com a morte de um indivíduo. Antonieta ficou só! O tempo, as eleições e a casa, já não têm importância para ela. Este retrato, poderia ser um sonho. Bom ou mau, não interessa, porque, confunde-se com a nossa realidade. Senhor Presidente da República, senhores ministros e líderes partidários em geral: perceber isto faz parte da acção política! Transformar a democracia e a política de uma forma geral, num assistencialismo eleitoral cíclico e incompatível com as necessidades básicas quotidianas das pessoas, é próprio de um oportunismo desprezável. Cada processo eleitoral no nosso país, é excessivamente vulnerável ao assistencialismo desenfreado e à compra de votos, contribuindo assim, para o desequilíbrio na disputa eleitoral, consubstanciando a falta de autenticidade do poder na nossa terra. O país novo, ficou velho cansado de esperar, definitivamente inacabado como a casa de Antonieta. É preciso um novo rumo e impulso reformador para mudar as coisas.
CARTA ABERTA AO POVO
Caríssimo Povo
Sei que sofreis como Eu e Tomé, apertados que estais, entre a vergonha e a miséria, enquanto os bonzos deliram com o vosso conformismo e paciência. Angústia é pouco para qualificar o nosso estado de espírito momentâneo e o Atlântico parece calmo e obediente ante a irreverência e desobediência das nossas lágrimas. Não esperávamos um bilhete-postal vosso nesta altura, porque, ocupado como estais com o mínimo para a vossa sobrevivência, tememos não terdes tempo para empreender capricho tão valioso. Que bom compartilhar este sofrimento, angústia e desespero convosco! Houve um tempo e moda, que, o papão marxista, sob protagonismo da mesma senhora que agora vende o seu peixe aos gritos, debitava ladainhas e profecias ao povo, e este, sonhava e acreditava cegamente. Não lembrais: do programa avulso das nacionalizações; da mobilização geral para o trabalho voluntário nas roças; das perseguições políticas e prisões arbitrárias por motivos ideológicos; do sonho colectivo construamos com as nossas próprias mãos, uma pátria renovada; das anunciadas invasões do país por mercenários estrangeiros Tudo isto congelou na falsa abundância da gravana. Depois, noutro tempo e estação do ano, multiplicaram-se senhores e senhoras, bem como, profecias ou predições. O povo, confuso e adormecido começou por acreditar, para, rapidamente ignorar ou passar a detestar as criaturas em causa. Como predizer ou profetizar tão sabiamente e ninguém nos dar ouvidos? Teremos desagradado ao povo? Teremos perdido a confiança dos nossos Santos? Foram estas as interrogações que mais se ouviam na corte. Convencidos que o país implodisse, como Tróia caiu pelo facto de ninguém dar ouvidos às profecias que eram debitadas, os bonzos resolveram macaquear receitas oriundas de outras paragens: nós pagámos, eles votam, resolvemos a nossa vida e, se possível, a vida do país. A partir dai, sabeis perfeitamente o que aconteceu: tentativas frustradas de projectos messiânicos de poder como resposta à crise de formação da decisão política na nossa Terra; corrupção galopante em contraste com níveis alarmantes de pobreza; debilidade institucional e consequente desaparecimento do Estado, em contraposição ao fortalecimento de formas agressivas de conquista de poder como golpes de Estado e sublevações militar.
Meu Pobre Povo
A instabilidade governativa continuará a existir na nossa Terra, e consequentemente, a vossa incapacidade de resistir à atracção para o precipício tenderá a perdurar, enquanto o nosso sistema partidário não for auto-suficiente na sua produção de soluções de poder político. Não tenhais ilusões! Neste contexto concreto, em que se dá o confronto democrático entre partidos, a aceitação e interiorização da ideia de menorização da questão organizativa dos mesmos na nossa sociedade, e sua substituição por formas subtis e sofisticadas de mercantilização do sufrágio, implica que se aceite generalizadamente, uma forma dupla de fraude eleitoral e de concorrência desleal. Num primeiro plano, pode-se considerar, que, vence as eleições, o partido que tiver garantido apoios externos que lhe garantam sustentabilidade financeira para tal; enquanto os outros, estarão condenados a perder, independentemente das propostas que apresentem para o desenvolvimento do país. Num segundo plano, a assunção e institucionalização da ideia de secundarização e menorização da questão organizativa dos nossos partidos, implica que se admita, haver partidos políticos que concorrem aos actos eleitorais, sem terem criado as condições legítimas para executar as acções inerentes à delegação do poder na nossa Terra. Ora, isto parece-nos mais uma fraude, porque, ninguém nos garante que vós, eleitores, tenhais total conhecimento dessa deficiência. Pedimo-vos encarecidamente, não aceitais a ideia de que o Estado é um conjunto de organizações que podem ser apropriadas somente através de uma vitória eleitoral. Não será esta deriva irresponsável que, fez com que, a mesma elite política local, responsável pelo fabrico, planeamento e eleição do Senhor Presidente da República, Fradique de Menezes, seja a mesma que, agora o abomina e deseja mandá-lo para rua ? Das duas, uma: ou o homem é muito mau para o lugar que ocupa (coisa que Eu e Tomé já sabíamos) ou a dita elite se enganou. Deveremos continuar a acreditar numa elite partidária que se engana sucessivamente, induzindo o povo, voluntária ou involuntariamente, nesta corrente de enganos, obrigando-o a carregar continuadamente no tempo, este pesado fardo? Num contexto democrático, com a grandeza das dificuldades que o nosso país atravessa, devereis ser mais exigente, selectivo, determinado e perspicaz no reconhecimento da importância do Estado como instrumento do poder. Caso contrário, tereis mais corrupção, mais instabilidade política, mais pobreza, mais golpes de Estado e sublevações militar, mais vergonha e angústia; enquanto os bonzos hão-de rir desalmadamente da vossa inocência. Não dês razão ao provérbio chinês que diz: quando o dedo aponta a Lua, o tolo olha para o dedo. Muitos dos nossos políticos, infelizmente, não desistiram de continuar a olhar para o dedo, negligenciado o longo prazo. Por isso, viveis neste circo crónico que evocastes e a distância entre vós a as instituições democráticas do país, tenderá a aumentar com prejuízos para os mais pobres e marginalizados. Procurais ser mais exigentes convosco e depois para com os outros. Por isso, vos digo: neste contexto eleitoral concreto que se avizinha, se confrontados com ofertas de políticos, de natureza e origem inexplicável, recebeis sem hesitar. Posteriormente, peço-vos que analisais cuidadosamente: as linhas de força das propostas políticas dos diversos partidos e movimentos, para o desenvolvimento sustentável do país; o contexto temporal de materialização de tais propostas; a origem e os meios materiais e financeiros que hão-de suportar tais propostas; a equipa hierárquica de trabalho que dinamizará o programa em causa; o modelo de organização pretendido; como pretendem combater a corrupção no país; como pensam contribuir para o melhoramento ou valorização das formas organizativas dos diversos partidos políticos locais; que contributos válidos trarão para a credibilização das instituições e restauração da autoridade do Estado, etc. No fundo, esperámos que consigais decifrar, validar e legitimar, políticas e programas, que se preocupam com a nossa sociedade no seu conjunto, votando em consciência, independentemente de terdes recebido qualquer oferta. Não haverá tão cedo, uma outra oportunidade como esta, para mudar as coisas na nossa Terra. Prometemos interceder junto de Deus e da Nossa Senhora, no sentido de atenuar o vosso sofrimento e desilusão, mas, o verdadeiro milagre, estará nas vossas mãos e na vossa atitude. É com lágrimas que nos despedimos, ciente da hérculea tarefa que vos espera. Queiram aceitar os nossos cumprimentos. Tomé e António.
Batem a porta! Dizem-me que é um mensageiro especial com notícias de longe...
Meus caros Santos, Tomé e António!
Permitam-me tratar-vos de forma informal. Peço-vos antecipadamente desculpas, pelo facto de ousar escrever-vos, negligenciando as eventuais consequências esotéricas decorrentes deste acto, para mim próprio e para o país. Tendo esgotado todos os recursos térreos, local e internacional, no sentido de suavizar os efeitos da desgraça que se aproxima de nós apressadamente, venho humildemente, recorrer da Vossa sapiência, no sentido de proteger-nos da nossa Santa Mediocridade. Quem melhor do que os nossos Santos, para combater a nossa valente Santa Mediocridade? A senhora tem sido muito má para com a generalidade dos pobres e remediados, e, não há alertas, inquéritos, tribunais, comissões parlamentares, eleições, Procuradoria-Geral da República, Juízes, prisões, ONU, NATO, ou qualquer outra entidade, que, nos proteja. Sinto que estarão angustiados, tristes e cabisbaixos com a cascata acelerada e rocambolesca de acontecimentos, nas terras a quem emprestaram nome e título; mas, isto por si só, serviu para embalar as minhas intenções iniciais.
Querido Tomé!
De facto, todos os dias, uma parte do mundo deleita-se com a chacota que grassa nas ilhas; enquanto a outra, incrédula e estupefacta, parece não acreditar no que vê, contrariando os princípios e teses que te santificaram como um incrédulo relativamente à ressurreição de Cristo. Sei que sofres com a nossa incapacidade inexplicável de resistir à atracção para o precipício, no que se refere aos casos insólitos, extravagantes e repetitivos que perduram na nossa democracia. Desculpar-me-ás o atrevimento, relativamente ao facto, de, considerar o regime em causa como democrático; mas, não me ocorre palavra adequada, neste momento em que te escrevo. Tenho poucas novidades para te dar, pois creio, estares na posse de informação suficiente, tendo em conta o teu estado de angústia e tristeza. Sabes no entanto, quem esteve no poder durante os últimos trinta anos na nossa Terra? É o mesmo partido que, não tendo feito qualquer introspecção séria e rigorosa sobre as causas do seu falhanço governativo neste período, e, consequentemente, tendo dispensado o mínimo esclarecimento ao povo sobre o assunto em causa, prepara-se de novo, para pedir mais uma oportunidade ao referido povo para governar. Meu caro Tomé, achas que alguém pode acreditar nesta metamorfose? Vamos ver para crer, dirias tu! Não sei no entanto, se, ainda nos resta tempo, para salvar as nossas crianças, os nossos idosos, as nossas mulheres e jovens, neste circo cruel, de experiências e amadorismo. E sabes qual foi a resposta dos principais partidos da oposição? Resolveram coligar-se, para lutarem por meia dúzia de lugares de deputados na Assembleia Nacional e defenderem melhor os interesses das suas elites hierárquicas. Ninguém sabe o que pensam sobre os graves problemas do país e forma de ultrapassá-los. Para eles, o povo é burro e miserável, condição perfeita para que, os dólares possam realizar o milagre de multiplicação dos votos e, consequentemente, garantir o sucesso eleitoral. Dirias tu, provavelmente: é o avanço do gangsterismo político na nossa terra, na sua forma primária e certeira. Para além dos problemas estruturais existentes, que, requerem reformas das instituições, dos hábitos e comportamentos dos agentes políticos, passámos rapidamente contrariando o nosso léve-léve da percepção generalizada de um povo pacífico, sereno, calmo e responsável, para o caos total. Esta mistura de sublevações ou insurreições militar, golpes de Estado, corrupção, desorganização e falsificações de toda a espécie, é actualmente, a nossa imagem de marca além fronteiras. Falsificam-se documentos de identificação, certidões de habilitações, passaportes, cartas de condução, dólares, etc. Somos momentaneamente um país de falsificadores. Até a própria democracia é falsificada. É neste contexto socioeconómico, político e cultural, que se pretende vender o nosso turismo e criar condições para fazer crescer o investimento estrangeiro no país. A resposta para todos estes problemas, dizem alguns, estará na disseminação pelas repartições públicas do país, de livros de reclamações que, se converteram momentaneamente, em autênticas entidades mágicas. Outros acham que, coligações pré-eleitorais sem qualquer conteúdo programático sério e rigoroso, é a saída para o problema. O que achas de tudo isto meu caro S.Tomé?
Caríssimo e Sapiente António!
Que falta fazem os teus sermões, hoje em dia, nestas paragens! Para além dos peixes continuarem a comer tudo, temos de contar com a sagacidade, engenho e intimidação de outras espécies que, entretanto apareceram. Os Búfalos hibernaram; e, os Ninjas decidiram também saltar para a festa. Onde iremos parar meu caro Santo Antonino? Sabias que nos últimos cinco anos tivemos quatro governos, não obstante a quantidade de problemas que temos por resolver? É esta incapacidade de resistir à atracção para o precipício, que, vos falava anteriormente, a responsável pelo nosso fraco desempenho como povo. Meu caro António, sabias que as eleições presidenciais se aproximam? E sabes de quem se fala nos corredores do poder, como sendo um possível pré-candidato para as eleições em causa? Fala-se do mesmo actor político, que, derrubou três governos no seu primeiro mandato presidencial, transformou o país num cemitério de governos e, não manifestou até hoje, qualquer remorso, arrependimento ou tendência para arrepiar caminho. Isto quer dizer que, num eventual segundo mandato presidencial deste actor político, onde normalmente há tendência para amplificação desta conduta por parte dos titulares do referido cargo, teremos sem exagerar, o dobro de governos desta presente legislatura. Não sei o que será de nós meu caro Santo Antonino! Peço-te encarecidamente que intercedas por nós, junto de Deus e da Nossa Senhora, no sentido de nos livrar de toda a tirania suína e abjecta. Uma cultura de liberdade, responsabilidade e solidariedade, não se ensina somente; transmite-se pelo exemplo de quem a pratica. Ora, a actual organização e dinâmica dos nossos sistemas político e institucional é desincentivadora de tais predicados. Não achas meu querido Santo? Meus caros Santos, despeço-me com lágrimas, esperando notícias vossas. Queiram aceitar os meus cumprimentos e consideração.
O Carnaval em muitas localidades de Portugal, é sinónimo de ritmos, cores e máscara. Os ritmos que, variam desde marchas, passando pelo samba e outras variedades, simbolizam a heterogeneidade e o arquétipo local indisfarçável, cada vez mais marcante. Esta variedade rítmica, invade diariamente as nossas casas, bairros, lojas e outros recintos, galga estradas e avenidas, entrando pela Escola impiedosamente. Será que já demos conta de que existe e manifesta-se quotidianamente em muitas Escolas de Norte ao Sul do país? As cores, para além de contribuírem com o seu brilho e dinamismo, para a essência dos três dias de folia, também não deixam de nos entrar pela Escola dentro, sem pedir licença. Será que também já reparamos que muitas Escolas do país são policromáticas por dentro como o Carnaval ? De facto, aceitemos ou não, vivemos num contexto societário multicultural, com ritmos e cores variadas, que, embora reconhecido e esporadicamente analisado e debatido, ainda não interiorizamos a sua essência, e, como tal, a Escola em particular, continua a tocar um instrumento monocromático, sendo ela policromática por dentro. Embora a maioria dos alunos das Escolas, de norte ao sul do país, seja de origem portuguesa, como não podia deixar de ser, condicionalismos locais emergentes, de que não podemos desprezar, tem-nas transformado em Escolas coloridas, com alunos oriundos do Brasil, Ucrânia, Cabo Verde, Angola, S.Tomé e Príncipe, Guiné Bissau, Moçambique, China, França, Inglaterra, Espanha, U.S.A, Venezuela, Moldávia, Roménia, Irlanda, Argentina, Cuba, Escócia e outras paragens. É óbvio que, uma Escola tão heterogénea, provocada pelo crescimento e diversidade populacional local, não pode continuar a tocar e dançar de forma monocromática, desprezando a realidade multicultural envolvente. A concepção e execução dos diversos Projectos Educativos das Escolas, não podem desprezar esta realidade, permitindo assim, que, as mesmas possam tirar as mascaras e compatibilizarem-se com os seus espaços exteriores envolventes, passando a serem vistas de fora como policromáticas.
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