A celebração da Páscoa é sempre convidativa aos períodos de reflexão, tendo em conta todo o simbolismo religioso e afectivo inerente.
S.Tomé é dos Santos da Igreja, aquele que é ciclicamente invocado por causa da sua incredulidade. Consta que, estando fechadas as portas da casa onde os discípulos se encontravam, fugindo dos Judeus, veio Jesus, colocou-se no meio deles mostrando-lhes as marcas do seu corpo crucificado. Foi enorme a alegria daqueles discípulos pelo facto de terem visto o Senhor. S.Tomé, um dos doze Apóstolos, não estava presente quando isto aconteceu. Os discípulos disseram-lhe: Vimos o Senhor! Ele, perante uma declaração destas, não se deixou impressionar, permanecendo insistentemente no seu cepticismo: Se não vir nas suas mãos o sinal dos cravos, e não meter o dedo no lugar dos cravos e a mão no seu lado, não acreditarei. Dias depois, estando os discípulos outra vez em casa e já com a presença de S.Tomé, apareceu Jesus no meio deles e disse: A paz esteja convosco! Dirigindo posteriormente a S.Tomé rematou: Põe aqui o teu dedo e vê as minhas mãos; aproxima a tua mão e mete-a no meu lado; não sejas incrédulo, mas crente. S.Tomé respondeu-lhe: Meu Senhor e meu Deus! Jesus disse-lhe: porque me viste, acreditaste; felizes os que acreditam sem terem visto.
Provavelmente todos nós, parentes de Tomé, rendemos ultimamente aos contornos desta evidência, resolvendo amplificar o significado desta réplica de Jesus, e, na impossibilidade de O ver e confraternizar com Ele, arranjamos um exemplar semelhante: o nosso Gugú. Toda a gente já ouviu falar em Gugú e acredita piamente no mesmo sem nunca o ter visto. Há quem vai mais longe e declara que são seres anormalmente baixos, anões, simpáticos e acéfalos. Estas características transformaram-lhes em seres muito procurados, sobretudo em momentos marcantes da nossa vida colectiva como os eleitorais. Indiscretos e selectivos, os Gugús só alimentam de ovos que arrancam diariamente das parcas reservas alimentares dos humildes, em troca de promessas milionárias que contribuem para a mitificação do seu reino. Toda a gente quer ter um Gugú em casa! Toda a gente sonha com Gugú! O problema é que se transformaram em seres invisíveis. Acomodatícios, mudam sistematicamente de opinião, tantas vezes quantas as necessárias, de acordo com o barulho da plateia ou com a cor dos ovos que ingerem diariamente. Alimentando-se de ovos, todos nós percebemos os propósitos destes minúsculos seres invisíveis, tendo em conta o simbolismo de nascimento, origem ou princípio de vida, inerente à dieta alimentar em causa. Têm medo que os indiquem a dedo, que profiram o seu nome ou ainda, que refiram a sua existência. Por isso, poucos são os humildes que declaram já terem visto o Gugú. Incapazes de tomar qualquer iniciativa, propor e/ou mobilizar para uma causa ou desígnio nacional ou de sonhar com um futuro que nos sirva a todos, os Gugús assumem poses, discursos e práticas, legitimadoras da lenda de que são autênticos protagonistas históricos. E assim, vamos construindo um país de Gugús que, momentaneamente deixou de ser lenda e virou realidade. Quem se ressente com o espectáculo destas criaturas é a Pátria que, exausta, enxovalhada, humilhada e triste, reclama a virtude dos nossos Santos para atenuar a regressão cultural e intelectual que nos assola. Somos de facto, um país de extremos: passamos rapidamente de cépticos compulsivos para os contornos de uma crendice patológica incompreensível. Só assim se compreende que, num contexto de grande vulnerabilidade e incerteza, fomos capazes de, com grande dignidade recusar trabalhar nas roças dos colonos extorquidas por violência ou manha aos filhos da Terra, num gesto indiciador de grande carga e simbolismo político; da mesma forma se compreende a origem da rendição que se apoderou de nós, transformando-nos em súbditos patéticos e descontrolados dos invisíveis Gugús. Poucos países de dimensão minúscula, foram tão importantes, para o bem e para o mal, em momentos diferentes da história económica e capitalista do mundo como o nosso, fruto da sua situação geográfica e do consequente desenvolvimento do comércio de escravos, do negócio altamente rendível do açúcar e mais tarde do café e do cacau. Momentaneamente, descortina-se um ciclo de petróleoque, aparentemente, atormenta mais do que mobiliza; enfraquece em lugar de solidificar. Esta polivalência (açúcar, escravos, cacau, café, e petróleo) compreensível e entendida, tendo em conta os condicionalismos de natureza histórica, económica, geográfica e geológica, encerra uma aparente contradição. Não sendo inicialmente povoado, contribuímos de forma decisiva com o armazenamento e fornecimento de mão-de-obra escrava para a consolidação de algumas economias do mundo; não tendo vocação natural para o desenvolvimento da monocultura, desempenhamos um papel importante ao nível do mundo, no negócio altamente rendível do açúcar e mais tarde do cacau e café; com uma dimensão territorial desprezível, o país alberga no interior do seu subsolo, reservas importantes de hidrocarbonetos.
Provavelmente é este património histórico, económico e cultural, repleto de polivalência e aparente contradição que, permitiu ao país ir resistindo ao logo dos tempos, os tumultos e devastação da moral provocadas pelos Gugús. Sou incrédulo relativamente à possibilidade de vencermos o Gugú nesta conjuntura errática de cedência à ligeireza, à desonestidade e esperteza saloia, sobretudo porque, são seres invisíveis que não são de ninguém e não pertencem a ninguém; mas sou crente na possibilidade de o combatermos de forma impiedosa, limitativa dos estragos que nos provocam, caso contrário, é próprio país que há-de transformar-se num Gugú. Se isto acontecer, não haverá ressurreição que nos valha.
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